Louco isso não? Estou lendo um livro: Tempo de esperas do Padre Fábio de Melo, ainda não terminei, tenho dificuldades em me concentrar e fazia tempo que não lia, coisa que sempre amei fazer. No livro há uma troca de cartas entre um professor e um jovem estudante que quer compreender o tempo das esperas. No começo achei ruim, mas como fã de Fábio de Melo, fui ler , há que se ler nas entrelinhas, fazer o paralelo, entre os personagens e o que passamos. Um parágrafo me instigou. Perdas diferentes, ensinamentos iguais. Perder é uma forma de ganhar. É só olhar o avesso da derrota. Há ensinamentos que sobrevivem velados em locais estranhos. Vitória na derrota? Claro que há. É só modificar o jeito como olha para a realidade. (Tempos de esperas. Pe. Fábio de Melo, pág 31.)
Toda perda assume um ganho (...) No livro o jovem perdeu um amor, o velho professor a esposa. Então fiquei pensando, filosofando, o que perdi? Ganhei algo com minhas perdas? E a resposta foi sim.
Sim. Tive perdas sem volta e perdas temporárias. Perdi os seios, a saúde, os cabelos, a vitalidade,a vaidade, algumas vezes até a dignidade; me perdi de mim mesma; perdi a convivência com meus alunos, meus amigos, minha família; perdi a inocência de achar que todo mundo me via como a amorosidade com que eu os via; perdi dias de sol, de chuva e/ou lindos, deitada em minha cama; perdi noites de sono com dor e aflições; derramei rios de lágrimas por tais perdas e pelas que achei que perderia. Nunca mais fui a mesma, nada mais passou por mim sem deixar algum tipo de marca, medo ou frescor. Fui ao fundo do poço, me enterrei em desespero, me escondi de medo, tive medo de sentir medo. Medrei. Perdi. Chorei. Teve dias em que morri, que desejei morrer, que implorei pra não morrer. Sobrevivi. Vivi.
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enfermeiras da quimioterapia |
Depois de tudo isso, como posso afirmar que ganhei com minha perdas? Ganhei. A doença me fez caminhar por um caminho diferente, me resgatou de uma vida louca de trabalho incessante, trabalho este que amo e me faz muita falta, mas para qual dedicava tempo demais. Tempo. Esta aí mais um ganho. Embora eu tenha meu tempo ameaçado, entendo que nenhum de nós pode dizer quanto tempo tem e por isso mesmo devia viver de maneira que não houvesse arrependimentos. Posso ter na doença uma ameaça aos meus sonhos futuros, mas nem por isso devo deixar de sonhar. Idealizar, estabelecer uma meta, um querer para o amanhã. Ganhei vontade de viver, ganhei sabedoria em valorizar um sorriso, um beijo, um abraço, uma visita, um presente; ganhei sentir felicidade verdadeira em poder levantar o braço, levantar da cama, lavar um prato, lavar os cabelos(mesmo os poucos fios), abrir os olhos e perceber-me viva.
Quando perdi amigos, foi que ganhei os melhores. Quando me senti abandonada, ganhei colo de pessoas maravilhosas . Quando perdi meu direito de ir e vir, foi quando alcancei as maiores distancias, conhecendo lugares e pessoas maravilhosas, distante geograficamente, “ajuntados” pela doença sim, mas não só por ela, pelo carinho, pela dor, pela empatia, pela troca, pelo guaraná, face , blogs, sala de espera.
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Dr. Vinicus Fisioterapeuta |
Quando adoeci, quando tive que mudar meu caminho, foi que encontrei pessoas maravilhosas, profissionais queridíssimos que cuidam de mim de maneira impar, anjos como as enfermeiras, atendentes, fisioterapeuta, assistentes sociais, psicólogas,radioterapeutas e técnicos, médicos enfim, toda equipe da Uopeccan em Cascavel,pessoas que me fazem esquecer a distancia percorrida, a dor sentida, como minha médica que amo feito mãe, embora dela, mais filha seja.
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Dr. Fernando L. Motter |
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Dra. Sara e seus zoios
que alumeiam minha vida. |
Quando o caminho ficou difícil, foi que consegui ver a beleza da paisagem. Quando a dor era maior que qualquer sentimento, a ausência dela era o êxtase.
Quando o espelho teimava em me mostrar quem não reconheço,houve quem visse beleza em mim. Quando me sentia a mais infeliz e fraca das pessoas, a guerreira se fazia presente através da admiração de pessoas que jamais supus.
Ganhei mais que perdi. E embora as percas sejam grandes e significativas, não maldigo minha sorte, não dou graças a Deus por ter câncer, mas dou por aprender com ele, por ele ter passado por mim e ter me modificado, moldado, melhorado.
E quer saber? Se está lendo este post agora, com certeza, é um dos meus ganhos, dos meus bens adquiridos,o melhor do meu ruim. Pois quem me visita neste refugio, são os que sabem de mim, que me querem bem e eu te agradeço por demais por estar em minha vida, por fazer dela mais leve, mais bonita,alegre, por me sentir tão querida. Por me animar, reavivar as esperanças, fortalecer a minha fé.
Um beijo estalado, abraço apertado e minha prece para que os dias sejam cheios de esperanças e abençoados pela graça de Deus. A quem tudo devemos, pelo qual tudo podemos , pelo qual suportamos todas as perdas e de onde vem todas nossas vitórias.
Ps: Eu gostaria de ter fotos de todos pra por aqui, sintam-se todos devidamente fotografados e publicados.